sábado, 3 de agosto de 2013

O pregador

            Num dia de semana comum, no horário de almoço, estava lendo um livro na pracinha do Setor Comercial Sul. Costumo ficar ali, concentrado na leitura. Concentrado é maneira de dizer. O cronista nunca está 100% concentrado. Está sempre com um olho no gato e outro no prato.
            Distraído na leitura, aproveitava para observar o movimento agitado de um dia de semana. Muita gente passando, algumas pessoas conversando, outras sentadas. Tudo na maior normalidade na Capital do Brasil.
            De repente, um grito vindo do nada me assustou:
            __ O senhor é meu pastor e nada me faltará!
            Olhei espantado e vi, ao meu lado, no meio da praça, um pregador. Impressionante! Parece que ele apareceu ali do nada, como um relâmpago. Bíblia na mão, paletó, gravata, sapato impecável, cabelo com gel e sem barba. O sujeito tinha caprichado no visual e parecia muito motivado.
            __ Mude de vida enquanto há tempo!
            Fiquei observando aquele espetáculo. Algumas pessoas foram chegando. Muitos passavam rápido. Outros paravam para ouvir. Uns riam. Outros abanavam a cabeça. Alguns até prestavam atenção.
            __ Mude agora porque o tempo está chegando! Jesus está voltando!
            Ele gesticulava. Levantava os braços. Agitava todo o corpo. Girava com um pé só no chão. Sua voz era rouca e seus olhos, de fogo. O suor escorria pelo rosto. Parecia em transe.
            __ Sua vida não pode continuar assim! Você está em pecado! Tudo precisa mudar!
            Fechei o livro. O sujeito parecia falar para mim. Olhei para os lados. Acho que alguém me olhava de rabo de olho. Engoli em seco.
            __ Egoísmo! Orgulho! Vaidade! Luxúria! Mentira! Saia dessa vida! Saia dessa vida! Saia agora!
            De repente, ele girou na ponta do pé e parou olhando firme para mim, com aqueles olhos terríveis de fogo e um dedo apontado na minha direção.
            Senti minha orelha esquerda queimando e minha boca seca. Uma gota de suor desceu pela minha testa.
            Quando ele virou de costas para mim, não pensei duas vezes, saí sem olhar para trás, antes que as coisas piorassem.
            No caminho, voltando para o trabalho, refleti sobre tudo aquilo e tomei uma firme decisão: hoje mesmo, quando voltar para casa, vou tomar uma cerveja.

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