sábado, 23 de junho de 2012

O gênio que o homem deixou sair da garrafa


                        O escritor inglês George Orwell, do alto de sua notável inteligência e senso de justiça, no conturbado início do século XX, disse: “a máquina, o gênio que o homem impensadamente deixou sair da garrafa e não consegue colocar de volta.” Eu, neste maluco início do século XXI, atualizo a sua frase e digo: a tecnologia, o gênio que o homem impensadamente deixou sair da garrafa e não consegue colocar de volta, quer nos dominar completamente.

                        Eu já disse aqui que a minha avó criou seus oito filhos na roça, sem energia elétrica, sem geladeira, sem televisão, sem telefone, sem computador e sem internet. Eu não estou falando do distante século XIX, mas da segunda metade do século XX! Hoje é praticamente impossível para nós, os modernos do século XXI, imaginarmos um mundo sem celular e internet.

                        Basta andarmos pelas ruas de nossas cidades. Basta entrarmos num transporte público. Basta observarmos o mundo a nossa volta. Não veremos uma pessoa sem um aparelhinho altamente tecnológico nas mãos. Morando na capital deste Brasil, um país ainda considerado selvagem por muitos, esquecido aqui neste quente e distante planalto central, circulando de metrô, vejo todos os dias, o grande fascínio por estas maquininhas. É um senhor que joga. É a mocinha que escuta música. É o executivo que checa seus emails. Tudo muito simples, ao toque dos dedos.

                        Meu celular não é sensível ao toque, não acessa a internet, não tem grandes recursos. Sou mesmo um atrasado. Minha televisão é em cores. Para mim, só isto basta. Mas ela não é tela plana, não é HD, não é 3D. Sou um completo atrasado no meu próprio tempo. Quando começo a me acostumar com as novidades, elas já estão defasadas. A todo instante, as novidades nos atropelam. E eu fico aqui num estado de completa perplexidade com o nosso tempo.

                        Veja, abaixo, a definição de um celular no século XXI:

O iPhone é um smartphone com funções de ipod, câmera digital, internet, mensagens de texto (SMS), visual voicemail, conexão wi-fi local e, atualmente, suporte a videochamadas (FaceTime). A interação com o usuário é feita através de uma tela sensível ao toque.

                        Mas eu só preciso de um aparelho que fale, tenha uma agenda e passe mensagens...

                        Veja, então, o que é uma TV hoje em dia:

TV 63" Plasma 3D Full HD - (1.920x1.080 pixels) Media 2.0 (Internet@TV, DLNA Wireless e USB 2.0) UltraSlim (3,6cm) c/ Decodificador p/ TV Digital Embutido (DTV), 600Hz, Conversor 2D p/ 3D, Função REC Extended PVR, 4 Entradas HDMI, 2 Entradas USB 2.0 e Entrada PC.

                        Sinceramente, não sei nem o que é a maioria destas definições. Eu só preciso de uma TV com boa imagem em cores, para eu assistir ao jogo do meu Cruzeiro. Só isto me basta.

                        Mas depois que a gente se acostuma com uma novidade tecnológica, pronto, não se consegue mais viver sem ela. É aí que mora o grande perigo: o risco da dependência tecnológica, tão comum em nossos dias. Não conseguimos nem sequer imaginar o que seria o nosso mundo sem estes maravilhosos aparelhos. Como minha avó conseguiu?

                        Quando fiz meu primeiro curso de computação, a menos de vinte anos, a frase inicial do professor foi:

                        __ Este aqui é um computador. Não precisamos ficar com medo, pois ele é apenas uma máquina burra. Os inteligentes aqui somos nós.

                        Saudosos e felizes tempos.

                        Outro dia li que o ser humano está em acelerado desenvolvimento de computadores mais inteligentes que nós. E não apenas isso, na mesma reportagem os cientistas disseram que os computadores serão tão sentimentais quanto os humanos.

                        Isto é assustador! Imaginar um computador mais inteligente que eu não é assim tão difícil. Mas imaginar uma máquina mais sentimental do que eu, com minhas crises de carência afetiva, é totalmente impensável para mim.

                        São os seres humanos querendo brincar de Deus, o que acontece desde os tempos da Torre de Babel, Gênesis 11, 1-9.

                        Prefiro ficar por aqui com o nosso poeta maior, Carlos Drummond de Andrade, que tão bem disse no seu poema “O sobrevivente”:



Um sábio declarou a O Jornal que ainda falta muito

Para atingirmos um nível razoável de cultura.

Mas até lá, felizmente, estarei morto.


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